domingo, 30 de dezembro de 2012

Intelecto: ajuda ou peso em nossa bagagem?

Walter S. Barbosa[1]

Ao estabelecer seu “ministério”, o Cristo cercou-se de homens simples, na maioria pescadores do Mar da Galiléia. Entre eles foram eleitos os “doze”, a quem o Divino Instrutor entregava os ensinamentos mais profundos, ensinando “aos de fora” por parábolas.

Por que razão Jesus foi procurar seus discípulos junto a esses homens rudes, ao invés de preferir os intelectuais, os sacerdotes do Templo que, em função de sua cultura e capacidade de atuar como “formadores de opinião”, teriam aparentemente melhores condições de assimilar e propagar sua mensagem?

A resposta para isso é bastante óbvia. Os “doutores da Lei” estavam comprometidos com sua própria mensagem. A do Cristo vinha justamente contrariar seus interesses, colocando em risco a autoridade que desfrutavam junto ao povo. No final, foi o clamor do povo que O sentenciou, preferindo, sob a incitação dos sacerdotes, libertar Barrabás.

A dominação gera um laço misterioso entre dominadores e dominados. Eles se gratificam mutuamente, porque afinal há uma “mercadoria” em jogo, sustentada por meio da “tradição”: o anseio de segurança, de continuidade. Isso nos faz adversários de tudo que representa necessidade de alterar parâmetros, eventualmente lançando-nos em caminhos desconhecidos. A propriedade da matéria por trás disso chama-se inércia (tamas), afetando especialmente nossa disposição para pensar. É a “preguiça” em todas as suas facetas.

Na “Escada de Ouro” descrita por H.P.Blavatsky[2], há um trecho que nos convida a ter “mente aberta, coração puro e intelecto ardente”. A expressão “ardente” sugere ligação com o fogo. Este pode queimar de forma renovadora – limpando a erva má para que a boa prevaleça – ou simplesmente de maneira destrutiva.

O que caracteriza um homem de cultura, na acepção comum? Ser detentor de muitas informações na perspectiva horizontal do conhecimento, onde a complexidade é extrema, pela diversidade que a caracteriza. Nessa condição, o observador está olhando a “pirâmide” do conhecimento de baixo para cima, sendo para ele difícil enxergar a relação entre as partes. Daí para o “materialismo”, ou ceticismo, a distância é um passo.

A respeito, o teósofo indiano I. K. Taimni[3] diz: “Somente quando a consciência de um indivíduo está apta a entrar em contato com a mente divina é que ele percebe o seu trabalho e conhece o esplendor das realidades internas ocultas nos planos espirituais, por trás do trabalho aparentemente caótico e sem propósito do universo físico”.

A “Escada de Ouro” refere-se ao intelecto ardente desse homem que, por ser de mente aberta e coração puro, tem condições de ir além da própria mente, tornando-a um canal do Espírito. O fogo alimentado aí queima as impurezas que nos prendem ao jogo dos apegos e auto-importância. Só dessa maneira cada um de nós pode deixar de ser um “sócio” de Barrabás, em cada momento preferindo libertá-lo ao invés do Cristo Interno.

Quando não sustentado pela pureza, o aprofundamento intelectual gera mais resistência e, freqüentemente, maus frutos. Curiosamente, porém, acabou ficando nas mãos de um intelectual – o apóstolo Paulo – a missão de fundamentar os passos iniciais do Cristianismo, depois de passar pelo fenômeno ocorrido na estrada de Damasco (encontro com o “Cristo Ressuscitado”), provavelmente simbolizando sua “Iniciação”.

Esse é o lado misterioso do intelecto: quando afinal se submete ao Pai, ao Eu Real, torna-se poderoso elemento de transformação, podendo mudar o mundo.               


[1] Membro da Sociedade Teosófica e da Universidade Livre para a Consciência
[2] BLAVATSKY, Helena. “Ocultismo Prático”, Editora Teosófica.
[3] TAIMINI, I.K. “O Segredo da Autorrealização”, Editora Teosófica.

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