Walter S. Barbosa[1]
Relacionamento:
a arte de compartilhar
Walter S. Barbosa[1]
“Segurança” é a palavra de ordem
na vida do ego. Qual a razão disso, marcando tudo que fazemos? É nossa
identificação com o corpo físico, cercado de insegurança por todos os lados.
Além de requerer atenção constante – alimento, higiene, exercício, descanso – a
morte é ameaça em cada esquina, ou mesmo no conforto de uma cama.
Entretanto, o ego sobrevive ao
físico, desaparecendo como “forma” apenas quando o corpo mental também se
dissolve. A partir do último suspiro, um atrás do outro os corpos físico,
astral e mental se extinguem, devolvendo aos planos da matéria seus elementos
constituintes, na medida em que deixamos de animá-los como espírito (a não
forma).
O que sobra de tudo isso? Guardada
no corpo causal (a entidade reencarnante), fica apenas a memória energética – vibracional
– obtida em cada corpo, determinando as condições potenciais da próxima
encarnação. Esta é inevitável enquanto houver carma a ser resolvido e também a ânsia
de reviver as sensações físicas. Isso durará até o dia em que os desejos
terminarem, daí vindo a ênfase do budismo quanto a esse aspecto.
Gostamos das sensações e
desfrutá-las, além de um ato de relacionamento, de certa forma gera compensação
para os reveses da vida. Com nitidez, desde o reino vegetal as sensações estão
presentes, havendo plantas que respondem ao contato humano, como a “sensitiva”
ou “dormideira”, e até as “carnívoras” que se fecham no contato com o inseto
que se aproxima. O problema com as sensações é se tornarem sensualidade e
memória, gerando demandas no campo emocional-mental.
A criança tem os primeiros
vislumbres da consciência física no contato com a mãe e objetos próximos,
inclusive chupando o dedão do pé. Enquanto isso, não é raro ela contatar outras
dimensões, tendo por amiguinhos as fadas e gnomos. Essa consciência se perde na
medida em que a criança desenvolve a percepção física, obedecendo a uma lei na
relação entre as dimensões: a vibração grosseira elimina a sutil, e vice-versa.
Pela mesma razão, não há termos de convivência entre a pureza e a impureza.
Na essência, os relacionamentos
seguem a mesma lei, daí ter dito o Cristo “Dize-me com quem andas e te direi
quem és”. No ato de nos relacionarmos, a busca de segurança é minimizada na
convivência com nossos pares, ou seja, somos relativamente abertos com pessoas
de vibração semelhante à nossa, pensando e sentindo de maneira mais ou menos
igual. Por essa razão, elas nos causam menos medo.
Dificilmente compartilhamos algo
com uma pessoa temida e, pela mesma razão, evitamos os desconhecidos. Porém, mesmo
com nossos conhecidos a confiança tem limite, pois no íntimo sabemos que esse
conhecimento é superficial e também que tais pessoas possuem a “senha” de nossas
fraquezas, especialmente nos relacionamentos íntimos.
Esse é o fato. Deduzimos que o
outro se esconde de nosso olhar, pois também fazemos isso o tempo todo. Nessas
condições como ficam os relacionamentos, inclusive os mais íntimos? Transformam-se
num jogo de gato e rato, onde nossos papéis (ou máscaras) se alternam,
misturando-se com atração e repulsão. Como estar em harmonia, como experimentar
a paz nesse permanente estado de desejo, tensão e luta?
Olhando em torno, vemos que esse
quadro está em toda parte. Podemos fazer algo para mudar? Sem dúvida, se de
fato admitirmos que isso é nosso reflexo. “Quando você muda, o mundo muda”. E o
caminho só pode ser abrir mão dessa tão grande necessidade de segurança cultivada
ao longo de muitas vidas – como herança do reino anterior em nosso cérebro
reptiliano – sempre aguardando um predador.
Como chegar a isso? Aplicando a
receita oferecida pelo Cristo no “Orai e vigiai”. Orar é buscar refazer (inclusive
pela meditação) as conexões com o mundo interno, onde o anseio de segurança vai
perdendo espaço porque a imortalidade é a natureza desse mundo. Vigiar é
observar nossa natureza inferior – depurando as sensações, pondo consciência nas
emoções e pensamentos, eliminando as máscaras que aí se alimentam.
Levando esse esforço à prática, podemos
então colocar uma luz em nossas vidas – e nas dos outros – pelo ato de compartilhar
do fundo da alma, dando algo de nós
para os relacionamentos. Essa é uma chave para a consciência. Por sua vez, a
consciência é a chave para o amor, eliminando simultaneamente as raízes da ignorância
e do medo.
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