quarta-feira, 25 de abril de 2012

“Os domingos precisam de feriados”


 Walter S. Barbosa[1]
Em texto de mesmo título acima, o rabino brasileiro Nilton Bonder oferece excelente reflexão a todos nós, quaisquer que sejam nossas crenças.
           
Sabe-se que a inquietação é algo inerente ao ser humano, sempre em busca de novidades. Isso reflete seu estado mental, chamado de “macaquinho bêbado picado por um escorpião, pulando de galho em galho” na tradição hinduísta. Diz Bonder:
           
“Feriado, dia de respeito e atenção a si e a vida... Toda sexta feira à noite começa o shabat. Para a tradição judaica, shabat é o conceito que propõe descanso ao final do ciclo semanal de produção, inspirado no descanso divino, no sétimo dia de Criação. Muito além de uma proposta trabalhista, entendemos a pausa como fundamental para a saúde de tudo que é vivo. A noite é pausa, o inverno é pausa, mesmo a morte é pausa. Onde não há pausa, a vida lentamente se extingue.
           
Para um mundo no qual funcionar 24 horas por dia parece não ser suficiente, onde o meio ambiente e a terra imploram por uma folga, onde nós mesmos não suportamos mais a falta de tempo, descansar se torna uma necessidade do planeta. Hoje, o tempo de ‘pausa’ é preenchido por diversão e alienação. Lazer não é feito de descanso, mas de ocupações ‘para não nos ocuparmos’. A própria palavra entretenimento indica o desejo de não parar. E a incapacidade de parar é uma forma de depressão.
           
O mundo está deprimido e a indústria do entretenimento cresce nessas condições. Nossas cidades se parecem cada vez mais com a Disneylândia. Longas filas para aproveitar experiências pouco interativas (...) Fim de dia com gosto de vazio. Entramos no milênio num mundo que é um grande shopping. A internet e a televisão não dormem. Não há mais insônia solitária; solitário é quem dorme.
           
As bolsas do Ocidente e do Oriente se revezam fazendo do ganhar e perder, das informações e dos rumores, atividade incessante. A CNN inventou um tempo linear que só pode parar no fim. Mas as paradas estão por toda a caminhada e por todo o processo. Sem acostamento, a vida parece fluir mais rápida e eficiente, mas ao custo fóbico de uma paisagem que passa. O futuro é tão rápido que se confunde com o presente. As montanhas estão com olheiras, os rios precisam de um bom banho, as cidades de uma cochilada, o mar de umas férias, o domingo de um feriado...
           
Nossos namorados querem ‘ficar’ trocando o ‘ser’ pelo ‘estar’. Saímos da escravidão do século XIX, para o leasing do século XXI. Um dia seremos nossos? (...) Parar não é interromper. Muitas vezes continuar é que é uma interrupção. O dia de não trabalhar não é o dia de se distrair: literalmente, ficar desatento; é um dia de atenção, de ser atencioso consigo e com a vida. A pergunta que as pessoas se fazem no descanso é: ‘o que vamos fazer hoje?’ - já marcada pela ansiedade. E sonhamos com uma longevidade de 120 anos, quando não sabemos o que fazer numa tarde de domingo.
           
Quem ganha tempo, por definição, perde. Quem mata tempo, fere-se mortalmente. É este o grande ‘radical livre’ que envelhece nossa alegria - o sonho de fazer do tempo uma mercadoria. Em tempos de novo milênio, vamos resgatar coisas que são milenares. A pausa é que traz a surpresa e não o que vem depois. A pausa é que dá sentido à caminhada” enfatiza o rabino, finalizando:
           
“Não haverá maior sábio do que aquele que souber quando algo terminou e quando algo vai começar. Afinal, porque o Criador descansou? Talvez porque, mais difícil do que iniciar um processo do nada, seja dá-lo como concluído”.


[1] Membro da Sociedade Teosófica e da Universidade Livre para a Consciência.

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