quinta-feira, 26 de abril de 2012

Julgamento: o abismo que nos afasta do Ser


Walter S. Barbosa[1]
 “Não julgueis para não serdes julgados”, disse o Cristo. Entre as várias interpretações desse ensinamento está a realidade da projeção, quando externamos a medida atual de nossa própria consciência (ou caráter) ao julgar o outro. Quem vive na luz só vê a luz.

A consciência atua onde não há julgamento. Julgar é um atributo da mente, cheia de memórias infelizes e desejos reprimidos. Ou seja, tudo que nos cega. Em sentido pleno, consciência é um dos sinônimos de Deus, como o Ser que habita cada um de nós. Somos Deus, mas ainda não o vivemos plenamente. Assim, evolução significa crescer na direção dele, expandindo a consciência. O infinito é seu limite.
           
Conhecimento comum, esse encontrado nos livros, não é a mesma coisa que consciência, tendo mais a conotação de memória, um banco de dados. Assim, ele não é capaz de modificar nosso caráter ou mesmo algo mais superficial, como nossos hábitos. Existe, porém, uma coisa chamada “conhecimento real”, que às vezes qualquer acontecimento externo – a palavra de uma pessoa ou mesmo a informação de um livro – pode despertar, como se fosse a lembrança de um conhecimento mais profundo, gerando consciência. O conhecimento real acontece “dentro” e não depende necessariamente de palavras. Pode vir mais como um sentimento envolto em alegria, confiança, paz.

Os discípulos de Ramana Maharshi foram ensinados sempre pela sabedoria do silêncio. Era autenticamente “a voz do silêncio”. O mestre pouco falava, mas quem se sentava à frente dele, com o coração aberto, sentia suas perguntas respondidas. Mouni Sadhu, que passou por essa experiência, relatou-as num livro intitulado “Dias de grande paz”.
           
Temos dificuldade em mudar nossos hábitos. Porém, a mudança pode acontecer de repente, com ímpeto irresistível, quando a reflexão constante sobre um assunto mudou nossa energia, criando a força necessária. Assim “o homem se torna aquilo que ele pensa”. Energia, pensamento e sentimento são manifestações que andam juntas. Não pode haver pensamento ou sentimento elevado num corpo cheio de energias grosseiras, surgindo a necessidade da purificação. Maledicência, sensualidade e vícios de todo tipo estão necessariamente num corpo grosseiro. O nível de consciência possível aí deverá ser baixo.
           
Quando alguém assimila um comportamento superior, pode ter adquirido um novo patamar de consciência. Porém, enquanto não atingimos a estatura do Mestre podemos regredir. É como se a consciência oscilasse, por estar nosso corpo vibrando na energia antiga, fazendo a mente retornar aos padrões de pensamento anteriores.
           
No Universo há apenas duas realidades: consciência (espírito) e matéria (energia). Sob certos estímulos a matéria vibra, gerando percepção segundo a pureza da mente que observa. A percepção real – fruto da mente limpa, sem medo ou desejo – chama-se consciência. Como esse estado entre nós é raro ou parcial, predomina a inconsciência. Assim, a questão vibratória está por trás de toda relação. O amor – um dom divino – depende da energia capaz de manifestar o amor. Não se pode amar com a energia do ódio. Uma das características do amor é o não julgamento. Onde o julgamento está presente, o amor não está, a consciência não está (inclusive na falta de amor a nós mesmos).

O oposto do julgamento é a aceitação, sem raiva, frustração ou medo. Só assim podemos ver os fatos e não o que a mente determina, capacitando-nos a nos aproximar do outro, dar ou receber conselhos, conversar de alma para alma. Podemos crescer juntos.

O relacionamento é a base para a expansão do Ser, oferecendo um ponto externo de “resistência” para que a luz se faça dentro de nós. Convivemos mais na competição do que na cooperação. Contudo, sendo o amor a nossa fome maior, é para ele que caminhamos, mesmo fazendo tudo ao contrário. Assim como a evolução, a paciência de Deus é infinita.


[1] Membro da Sociedade Teosófica e da Universidade Livre para a Consciência.

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