Walter S. Barbosa[1]
Temos liberdade para agir no
mundo. Isso é o livre-arbítrio. Em contrapartida, colhe-se o que se planta, um
preço justo para aquela liberdade. Dessa forma, o livre-arbítrio se insere no
contexto da Lei do Carma.
A obrigação da colheita é que
legitima o livre-arbítrio, não deixando que ele se torne um roubo ou
desequilíbrio na economia universal. Aceitar o Carma é, portanto, um indicador
de maturidade espiritual. Não aceitar é só mais um ato de inconsciência.
Há castigo no Carma? Não há. Essa
colheita acompanha o movimento da mão do lavrador ao atirar a semente no solo.
A brotação fatalmente virá. Não depende de ninguém, pois está embutida na
semente. Por sua vez, a reação cármica sucede a ação do plantio, alimentando-se
do desejo, da nossa expectativa de obter algo no “vir-a-ser”.
Agimos segundo a consciência, mas
obedecendo ao padrão de energia em nossos corpos. Onde obtivemos esse padrão? Pelos
pensamentos constantes. Os elevados geram formas radiosas no mundo mental, viabilizando
emoções belas e ações puras.
Nossas ações em algum momento
podem ser distorcidas, mas a energia por trás delas não é boa nem má. É sempre
neutra, como a pedra que o escultor utiliza, podendo criar belas figuras ou
não. Igualmente, as leis divinas não são boas nem más.
Assim como o Carma é o preço do
livre-arbítrio, o poder é a recompensa, seja ele mundano ou divino. Como
podemos um dia despertar o Cristo em nós, segundo Paulo, sem tomar decisões? Sem
experimentar as conseqüências do livre-arbítrio? Por isso diz o Cristo “Toma
tua cruz e segue-me” - e não, “Passa-me tua cruz que a levarei”.
Origem de tantos conflitos, o
livre-arbítrio é a ponte para o poder. É a possibilidade que temos de enfrentar
os elementos do nível físico (água, ar, fogo e terra), representando forças que
hoje nos dominam. Esse é o berço da ira, da inveja, do ciúme, da gula e da idéia
de separatividade, cujo trono é o orgulho. Cada defeito vencido é acréscimo de
poder. Assim, o livre-arbítrio é a própria raiz da paternidade divina.
Sem tentação não há prova, sem
prova não há crescimento. Mais de uma vez podemos ter ouvido ou pronunciado a frase:
“Por que Deus já não fez tudo certinho?” Simbolicamente, isso acontecia no
Paraíso antes da expulsão, assinalando as primeiras duas raças humanas. Se um
de nós fosse colocado lá, por acaso seria feliz? Quantas vezes por minuto
contestaríamos a proibição de comer o fruto da árvore proibida?
Em seu nascimento, o poder liga-se
à possibilidade de contestar, de achar que se pode fazer melhor, como ocorre nos
primeiros passos do jovem fora de casa, buscando superar o jugo paterno.
Desobedecendo as ordens divinas, a resolução do “casal original” ocorre tão
somente porque o poder do Pai está em germe nos filhos.
O ego - esse eu “pecador” - é a
projeção de Deus no mundo, experienciando-o, degustando-o, conhecendo cada uma
de suas fibras. Só assim o ego pode entronizar o mundo e colocá-lo nas costas
como a “bagagem do Filho Pródigo”.
O poder mundano é baseado no
domínio sobre os outros (que estes em geral consentem, valorizando o objeto em
disputa). O grande salto dele para o poder divino se dá quando abrimos mão do
transitório em favor do eterno. Não há qualquer disputa em torno disso. Assim,
a opção do sábio é sobretudo um ato de inteligência, significando uma crescente
sensação de paz pelo simples abandono das conquistas terrenas.
Se o livre-arbítrio é a ponte em
direção ao poder, o Carma é o alicerce dessa ponte, nos tornando conscientes e
responsáveis por nossos atos. Verdadeiramente divinos.
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