Nelly Beatriz M. P. Penteado[1]
Uma agenda oculta contém coisas que você sente e
pensa em relação a uma pessoa mas não lhe diz, por vários motivos: ou para não
perder a simpatia dela (e para que ela continue tendo uma boa imagem sua, e
continue apoiando você), ou para não lhe dar a chance de rebater uma acusação
sua, para ter um trunfo nas mãos contra ela, uma razão que diga que você está
certo em não gostar dela (apesar de você nunca lhe dizer isso e nunca lhe dar a
oportunidade de se modificar naquele aspecto). Contém também intenções secretas
que podem existir em seus comportamentos.
Entre marido e mulher, é muito comum que, ao longo
dos anos, um deles (ou ambos) tenha uma agenda oculta, constituída de mágoas,
sentimentos negativos que jamais são revelados, mas através dos quais travam-se
batalhas silenciosas, inconscientes.
As agendas ocultas afastam as pessoas, porque geram
insegurança naquele que percebe que o outro não está totalmente no
relacionamento, está como que "com um pé atrás".
Apesar de o conteúdo de uma agenda oculta não ser
revelado, ele é pressentido, "intuído", através da observação da
comunicação não verbal do outro: seu tom de voz, seu olhar, seus gestos, sua
expressão, etc. Esta comunicação não verbal provém do inconsciente de quem fala
(de quem possui a agenda oculta) e é percebida e interpretada pelo inconsciente
de quem a recebe. Quem a recebe sente insegurança, angústia, rejeição, medo ou
ansiedade, mas não sabe explicar por quê, ou apenas tem uma vaga percepção de
que o outro está experimentando algo que não está sendo expresso verbalmente.
É quando alguém pergunta: "O que você
tem?", e ouve: "Eu não tenho nada, estou ótimo", dito num tom de
voz ríspido. Ou: "O que eu fiz a você para que me tratasse de forma tão
agressiva?", e o outro diz: "Mas eu não fui agressivo...", com
uma expressão furiosa.
Por medo, o outro é obrigado a se proteger e a se
afastar também. O relacionamento perde a espontaneidade, como se as pessoas
estivessem sempre em guarda, envolvidas nele apenas pela metade.
Uma pessoa com uma agenda oculta suga muita energia
da outra, que passa a lhe devotar maior atenção tentando saber o que se passa
na cabeça dela. Além de consumir sua energia, faz com que o relacionamento se
deteriore.
Como o marido que chegou em casa e encontrou a
esposa com uma expressão angustiada. Na verdade, a esposa está se sentindo só,
e talvez gostasse que o marido a convidasse para um passeio, mas não lhe diz
isso justamente para que o marido fique lhe perguntando ansiosamente sobre o
que está acontecendo. Ela se sente bem com a preocupação do marido e com a
atenção que ele lhe dispensa (a energia que ele lhe dirige). Já o marido, acaba
ficando desanimado, com pensamentos derrotistas, ou então fica se sentindo
culpado pelo estado da esposa .
Ou então aquela pessoa que não esquece um incidente
desagradável do passado, que guarda a mágoa como trunfo contra o outro. Ela não
diz nada a respeito, mas sua expressão revela a mágoa. Isso pode gerar
sentimentos de culpa no outro, que acaba sentindo necessidade constante de
reparar o mal cometido, como se fosse uma dívida eterna.
O que se nota em relacionamentos deste tipo é que
não existe troca, envolvimento. Um está querendo só receber, e à força,
arrancando do outro o que quer, e não querendo lhe dar nada em retribuição. É
uma batalha inconsciente, em que quem perde a batalha perde também a energia
investida por ambos, como num jogo.
Há muitas batalhas que são travadas
inconscientemente, ou pelo menos, de forma subliminar, de forma velada. As pessoas
acabam entrando nestas disputas, nestes jogos. Reflita: além da energia que é
sugada do derrotado, o que mais se ganha?
Penso que no fundo esta necessidade de vencer e
dominar sirva apenas e tão somente para diminuir a própria insegurança e impotência.
Porque quando vence outro, o indivíduo se sente forte (energizado) e nega sua
própria fraqueza.
Note que sempre que você trava uma batalha com
alguém em sua cabeça, a outra pessoa pode perceber e entrar nela também. Porque
existe uma comunicação inconsciente entre as pessoas, que é mediada pelos
sinais não verbais (gestos, expressão, etc.).
Perceba como isto acontece no trânsito. Um
motorista começa a tratar outro como se este fosse muito ruim ao volante, ou
como se estivesse, por exemplo, andando devagar, ou na contra-mão, ou tentando
ultrapassá-lo de propósito, só para irritá-lo, atrapalhá-lo. O outro motorista
percebe e entra no jogo, sentindo raiva também, como quem diz: "Quem ele
pensa que é? " O resultado pode ser desastroso para ambos. O que
ambos querem é impor ao outro: "Eu sou bom, eu estou certo, você não"
e também "Saia do meu caminho, não me atrapalhe".
Dentre as estratégias para lidar com situações como
esta, você pode adotar a de não entrar no jogo. Para perceber este tipo de jogo,
observe como se sente. Quando perceber que está se sentindo sugado, cansado,
"lutando", que não se sente bem consigo mesmo, mude seu
comportamento. Pare o que estava fazendo e mantenha-se tranqüilo, recusando-se
a tomar parte na disputa, na batalha, direcionando sua mente para outros
estados internos, para outros sentimentos.
Melhor seria se todos nós aprendêssemos a nos
relacionar com as pessoas de forma integral, transparente, com base naquilo que
o outro realmente é, de forma que houvesse troca (de afeto, experiências,
energia, etc.) e enriquecimento para ambos, ao invés de disputas em que se
tenta extrair à força o que se deseja, ou nas quais se procura aniquilar o
outro.
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