Walter da Silva Barbosa[1]
Os familiares
disseram já estar à espera do desenlace. Quem sabe, suspirando com o fim da exposição
na mídia, que constrói e devora seus deuses com igual sofreguidão, lucrando nas
duas pontas. A impressão é de que, em certo momento, a notícia da miséria vende
mais que o sucesso – e o problema naturalmente não está em quem vende.
Há certa
morbidez no acompanhamento que fazemos das agonias alheias – alegria dos circos
romanos – dando-lhe força pela pressão do mental coletivo. A magia obscura que
a mídia prolifera é somente um prolongamento das nossas expectativas.
Em outro
sentido, a valorização que a mídia coloca no ídolo dá aos seus adoradores um
sentimento de transferência de poder, centuplicado pelo estranho ardor das
massas. A mídia, porém não se engana na adulação que faz. Se para as pessoas aquela
imagem é uma projeção de aspirações, uma fantasia de poder, para seus promotores
nunca deixa de ser a mina de ouro fabricada por eles mesmos e alimentada por
nós.
Uma seqüência de
fotos, desde os tempos saudáveis, mostra a transfiguração da jovem no corpo e
no comportamento. De certa forma, uma radiografia da alma. Como não aprender com
essa obstinada lição de dor?
Mas realmente
não aprendemos. Em razão de nosso aprisionamento na rede mental, a experiência
e sofrimento alheios são sempre alheios. No exemplo dos santos e sábios a
questão se repete: apesar de inspiradora, a lição é incomunicável. Por isso nem
o sangue de Jesus pode nos salvar. Mas na inspiração desse sacrifício e sob a irredutível
Lei do Carma – ou Lei de Causa e Efeito – cada um salva a si mesmo. Não como
proeza do ego, mas do Cristo Interno – no que está implícito auxiliar o
processo dos outros. No caminho em direção ao Ser, nada substitui a sabatina de
agonias e glórias da experiência individual (facilitada no Caminho do Coração,
que tem cumplicidade com o Eterno).
Agonias, bem mais
que glórias. Seria outra a face daquela menina? Para a escritora Williamson[2],
que viveu o mesmo drama e descobriu a luz no ventre da escuridão, trata-se,
porém, de um retrato mais abrangente, algo que cada um de nós pode ter visto ou
vivido nos últimos tempos. Ela o classifica como problema de uma geração.
“Muitos de nós
sabemos que temos tudo o que é necessário - o visual, a educação, o talento, as
credenciais. Mas em certas áreas estamos paralisados. E não estamos sendo
barrados por algo externo, mas por algo interno. Nossa repressão é interior. O
governo não nos reprime, nem a fome, nem a pobreza. Não temos medo de sermos
enviados à Sibéria. Simplesmente temos medo, ponto. Nosso temor vai e vem como
as ondas. Temos medo de que este não seja o relacionamento ideal ou de que
seja. Temos medo de que não gostem de nós ou de que gostem. Temos medo do
fracasso ou do sucesso. Temos medo de morrer jovens ou de envelhecer. Temos
mais medo da vida do que da morte” diz Marianne. Sem dúvida, a jovem e frágil Winehouse
desistiu da vida.
A astrologia
mostra um efeito paradoxal no mapa de pessoas com muitos aspectos favoráveis: ausência
de entusiasmo para conquistas. Na perspectiva do ego – que não sabe amar – a
busca da felicidade se baseia em obter coisas. Se não há esse desafio nem se
sabe com certeza a razão de estar aqui, por que estar aqui? Os sensíveis acham
a resposta mais depressa, tanto a certa quanto a errada. A errada às vezes como
alternativa para o desafio inverso: falta de tudo, talvez pelo abuso em outras
vidas.
Marianne achou a
resposta certa no único lugar possível: Deus. Fora dele, sobra a falsa
autonomia do intelecto, cuja habilidade se limita ao controle das coisas (ferindo
a si mesmo e aos outros quando inclui pessoas). Órfão do coração e perdido no
labirinto do pensamento, o ego pode optar pelo “barato” que consome o corpo,
imitando o escorpião. E assim – adiando as lições imortais da vida – picar a si
mesmo.
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