Walter S. Barbosa(*)
A frase acima foi pronunciada por
Krishnamurti em 1929, ao dissolver a extensa organização que se criara em torno
dele, rejeitando assim a possibilidade de vir a ser adorado como um Messias ou
originar novos credos, apesar de ter atraído multidões como um autêntico
instrutor espiritual, até sua morte aos 90 anos.
Segundo ele, “A crença é uma questão puramente individual, e não podemos
nem devemos organizá-la. Se assim o fizermos, ela morrerá, ficará cristalizada;
tornar-se-á um credo, uma seita, uma religião para ser imposta aos outros”.
Nessa questão, quando
estabelecemos caminhos as possibilidades se reduzem, transformando aquilo em
fonte de segurança, rigidez mental. Então, o caminho que deveria ser trilhado
como lembrança ou direção, torna-se um rótulo, um patrimônio, restringindo o
significado da vida espiritual que é viver em harmonia com toda a criação.
Porém, como poderia o homem
descobrir a verdade que está em seu próprio interior sem a ajuda externa que as
religiões propiciam, enquanto seu aprendizado é tão dependente daquilo que
ouve, daquilo que vê? Em nome do próprio Krishnamurti organizações se criaram a
fim de divulgar seus ensinamentos.
Tomé acreditou porque viu.
“Benditos são aqueles que não viram e creram”, disse Jesus. Enquanto não somos
capazes de aprender no silêncio da alma – por meio da auto-observação, da
meditação – as religiões têm seu papel, avivando no mundo a lembrança do Eterno,
chamemos a ele Deus ou Alá. O que torna as religiões fonte de desequilíbrio é
se constituírem núcleos de poder, intitulando-se “únicas possuidoras da verdade”
pela boca de seus representantes. Isso tem a ver com o aspecto humano, não com
o Eterno.
Na filosofia esotérica, Deus – “o
Ser supremo e inefável, incompreensível para a inteligência humana”, como
define Helena Blavatsky – é a fonte da Vida Una, que nada exclui de si mesma,
sendo por isso a matriz da verdade. Diferenças no sexo, cor da pele ou religião
referem-se ao transitório homem externo. E a verdade? É aquilo que “é”, podendo
apenas ser vivida. Como um raio de sol, o amor ou a paz, ninguém a possui. Tão
só experimenta-se. Assim, testemunha o contrário aquele que em nome de seu credo
(ou grau de consciência) diz ser dono da verdade, provocando divisões e dor.
Também, a não ser pela retidão
que os Mestres de Sabedoria exemplificam, convidando-nos a segui-los, a verdade
não precisa de defensores. Se puramente mental, a defesa torna-se negativa,
prejudicando o que se defende. Avessa a pressões, a verdade atua no tempo
próprio, às vezes como a descoberta que fazemos, indagando surpresos: “Como não
vi isso antes?”. Aquilo sempre esteve ali. Freqüente na meditação, essa
experiência surge também nos relacionamentos. É o espelho do mundo apontando o Ser.
Como “aquilo que é”, a verdade é
o fato que só vemos com a mente nua, isenta de motivos. O motivo distorce o
fato e mata a verdade, como também mata o amor. Sem motivos, a mente vê mas não
julga, deixando agir os poderes intuitivos do coração, baseado em sentimento,
não em palavras.
Enquanto a mente polariza, discrimina – perdendo-se na
diversidade – o coração agrega, relacionando causas e efeitos. Como do alto de
um monte, aquele que está “além da mente” enxerga na planície o quase invisível
traço de união que totaliza a diversidade no Uno.
Imprescindível para as operações
diárias, a mente é parcial no tratamento com pessoas. Aí dividida, está sempre
se agarrando, dizendo que a verdade é isto ou aquilo, em busca de supremacia.
Já o coração prefere o silêncio ante o conflito, pois distingue a verdade em
toda parte ao focar o permanente e não o transitório. Por essa razão, como
ensina Ramana Maharshi, para os seres iluminados “tudo é real”.
Nenhum comentário:
Postar um comentário