terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

"Quem não sabe é porque não enxerga"


 Walter da Silva Barbosa[1]
A frase acima foi dita por um amigo que, em matéria de cultura intelectual, pouco domina além de escrever o próprio nome. Com relação ao essencial, contudo, tem algo a ensinar até para portadores de títulos acadêmicos (sendo estes freqüentemente causa de cristalizações mentais e vaidades que nos desviam do conhecimento real).

“Saber” é ir além do comportamento reativo que caracteriza a maioria das pessoas, deixando de alimentar o dia de ontem, a reprodução interminável do passado (em grande parte, a miséria do mundo), abrindo-se para as oportunidades de consciência de cada instante. Saber nesse nível é enxergar além das aparências, correspondendo à frase crística: “Vejam os que têm olhos de ver”, significando a mente limpa em certa medida para que a intuição possa fluir (o verdadeiro “terceiro olho”, segundo Helena Blavatsky).

Intuir alguma coisa nada tem a ver com pensar, nada a ver com palavras. É a linguagem da consciência, a manifestação do Ser que o pensamento ao invés de ajudar, contamina. Há um pensador funcionando ininterruptamente em nós, falando sozinho no chamado “diálogo interno”, como aquelas pessoas que às vezes encontramos nas ruas expressando-se em voz alta para uma platéia invisível, como lembra Tolle[2]. A diferença a nosso favor (talvez nem por isso sejamos “sãos”) é que conversamos na solidão de nossa massa cinzenta. O ego é o veículo desse pensador.

Relembrando emoções fortes, desejos insatisfeitos e até pensamentos que captamos de outras pessoas, o pensador mantém a tagarelice de nosso corpo mental, que se reflete no cérebro físico. Aliás, tudo que está no físico é reflexo do sutil.

Quando vamos reencarnar, o processo começa “de cima para baixo” com a formação do corpo mental, vindo depois o emocional (ou astral) e o duplo etérico (também chamado vital ou energético). O corpo físico que se forma a partir da fecundação no útero materno é uma cópia do duplo etérico, onde se encontram também os “chacras” ligados ao físico, alimentando esse corpo de prana, a energia de vida emanada do sol (alimento primordial). Todos esses corpos são formados com a ajuda dos seres da natureza, atuantes também nos demais reinos de vida.

A cegueira dos que não têm “olhos de ver” é causada pelos conteúdos do corpo mental, onde os sentidos na verdade funcionam. Quando aqueles conteúdos estão sujos (luxúria, inveja, medo, ciúme), tudo que captamos por meio dos relacionamentos (afeto, palavras, sabor, odor, sons, imagens) só pode ser apreciado no nível mais grosseiro. Por outro lado, ficam também prejudicadas as percepções espirituais a respeito deste mundo físico, que é justamente o que nós, como espíritos, viemos buscar aqui.

Assim como a sujeira mental nos impede de desfrutar obras ou prazeres refinados – porque não conseguimos enxergar sua beleza – também afasta-nos de pessoas que vibram numa condição mais sutil. Empenhadas no cultivo de valores permanentes, exigindo esforço e renúncia, tais pessoas representam tudo que o ego considera mortal. Por isso disse o Cristo: “Dize-me com quem andas e te direi quem és”.


Saber é a capacidade de enxergar a realidade do fato por meio da consciência. Entre a consciência e o fato encontra-se, porém, o espelho da mente. Se ele está sujo é impossível enxergar algo. Percebemos tudo de maneira distorcida, sendo essa a causa de nossos erros diários. Então, como disse meu amigo, quem não sabe é porque não enxerga. Considerando, porém, que a própria capacidade de enxergar se limita à consciência já desenvolvida, pode-se dizer que quem não enxerga é porque não sabe.


[1] Membro da Sociedade Teosófica e da Universidade Livre para a Consciência - UNICONS.
[2] TOLLE, Eckhart. “O Poder do Agora”, editora Sextante.

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