terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

Poder sobre si mesmo - o maior de todos


Walter da Silva Barbosa[1]
 “Querer é poder” – diz uma frase conhecida. Da maneira que geralmente entendemos e praticamos, contudo, querer tem mais a conotação de desejar. E desejar não é poder, apenas abrindo a “possibilidade para”, como impulso em determinada direção.
           
Desejar é um movimento passageiro, ainda que contínuo, ligado às ofertas ou necessidades do mundo material. Desejamos ter um carro, obter um emprego, alcançar certo “status”. Quando a meta desejada se realiza, o movimento do desejo muda de direção e tudo recomeça porque a rotina do desejo tem a natureza da insaciabilidade, gerando por isso os males da insatisfação, da intriga, da inveja, do adultério e tantos outros.
           
Não à-toa a filosofia budista tem talvez como ensinamento máximo as “Quatro Nobres Verdades”, resumidas: 1) na verdade do sofrimento, 2) na verdade do desejo como a causa do sofrimento, 3) na verdade da extinção do sofrimento pela remoção do desejo e, finalmente, 4) na verdade do “Óctuplo Caminho” para a extinção dos desejos.
           
Uma proposta de “extinção dos desejos” há de parecer à grande maioria das pessoas um absurdo completo. Afinal, nosso mundo gira em torno dos desejos. A filosofia esotérica, contudo, propõe que comecemos “substituindo desejos”. Que gradativamente coloquemos no lugar dos desejos mais grosseiros, escravizadores, aqueles que podem nos elevar, nos libertar.
           
“O ser humano é um bicho estranho. Está sempre querendo ver a onda chegar”. Assim uma de nossas amigas definiu o produto mais avançado da criação divina na face da Terra. A permanente expectativa da “onda”, por ela referida, refere-se ao nosso mundo voltado para as sensações, para o resultado dos sentidos externos.
           
A necessidade de repetir as sensações prazerosas fundamenta o nosso mundo de desejos. Sensações, contudo, têm começo e fim. Daí o sentimento unânime de que a felicidade ou é algo impossível de alcançar, ou efetivamente se resume em apelos mercadológicos como “Compre este carro e leve a felicidade para casa”. Ou “encontre a felicidade neste hambúrguer”.
           
O poder, contudo, não tem começo nem fim, como um atributo completo em si mesmo. Não deriva do desejo, mas da Vontade. E, como ela, não é uma meta externa estabelecida, é um estado de espírito, crescendo com o gradativo domínio de nossos desejos e busca de sensações.
           
Poder – com “p” maiúsculo – é o atributo máximo do Espírito. Em essência, é o que viemos buscar no trato com as coisas do mundo, desenvolvendo-o na medida em que compreendemos o próprio mundo, a partir de sua realidade dentro de nós. Começa com aquela pequenina “sensação de poder” que temos, por exemplo, quando um vício é suplantado.
           
Segundo Lindemann & Oliveira[2], “É conhecido o fascínio que o ser humano tem pelo poder e as mórbidas ‘necessidades’ daí decorrentes. Talvez seja mesmo a vaidade e o anseio pelo poder que criem todo esse cruel panorama no mundo. Curiosamente, essa ‘necessidade’ de impor a sua vontade e exercer o poder sobre os outros se apresenta, de modo geral, diretamente proporcional à incapacidade de o ser humano dominar-se a si mesmo. Pode haver maior contradição?”
           
O poder sobre esse nosso mundo interno é o único verdadeiro e, portanto, o único que perdura, pois não depende dos outros. É um daqueles tesouros que os “ladrões não roubam e nem a traça corrói”, como mencionado na Bíblia. Justamente por essa condição, é também o desafio mais difícil, segundo o filósofo Tales de Mileto, resumindo-se na célebre frase “Conhece-te a ti mesmo, e conhecerás o Universo e os deuses”.

Ainda segundo Lindemann & Oliveira, “O ideal da filosofia platônica, como teria considerado Sócrates, era que o homem se tornasse senhor de si mesmo, após ter conhecido a si próprio”.Também o Bhagavad-Gita; épico da literatura hindu, pela boca de Krishna sentencia: “Mais glorioso não é quem vence em batalhas milhares de homens, mas sim quem vence a si mesmo”.

[1] Membro da Sociedade Teosófica e da Universidade Livre para a Consciência – UNICONS.
[2] LINDEMANN, Ricardo & OLIVEIRA, Pedro. “Tradição-Sabedoria”, Editora Teosófica.

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