Walter da Silva Barbosa[1]
Da escritora brasileira Clarice
Lispector lembra-se a frase: “Que ninguém se engane: só se consegue a
simplicidade através de muito trabalho”. Talvez por isso, mesmo falar a respeito
pode não ser simples, partindo da fonte de complexidade a que chamamos
“intelecto”.
Um ponto, entretanto, parece claro:
a simplicidade é considerada uma virtude sempre presente no comportamento dos sábios,
dos mestres, não obstante seu extremo oposto – um homem primitivo, por exemplo –
aparente estados de simplicidade.
Também o irlandês George Bernard
Shaw tinha um conceito profundo a respeito do tema. Definiu simplicidade como
“o que há de mais difícil no mundo: é o último resultado da experiência, a derradeira
força do gênio”.
A definição de Shaw abre-nos uma
perspectiva interessante, indicando que a simplicidade, como “último resultado
da experiência”, é um olhar para trás – ou “de cima para baixo” – sobre o
conjunto dos fenômenos, estabelecendo relação entre eles a partir do ponto onde
se encaixam, no vértice da “pirâmide do conhecimento”, encarnando a consciência
que os liga. Por isso o gênio, o verdadeiro mestre, passa aos outros os
assuntos “mais complexos do mundo” de uma maneira simples, especialmente
enquanto estamos na esfera mental deles.
Em compensação, quando os
fenômenos são vistos de baixo para cima – à maneira do aprendiz, ainda que se
diga “mestre” – eles parecerão complexos porque encarados pela base da
pirâmide, separados entre si, sem uma relação de causalidade. Paradoxalmente, contudo,
ante a ausência de profundidade do muito ignorante, o complexo pode lhe parecer
simples.
Na sabedoria, de que se reveste a
simplicidade? Uma “espontânea profundidade”, acessibilidade, franqueza,
afabilidade, generosidade, compreensão e até mesmo certa “inocência” - são
termos que nos ocorrem, em uma lista que poderia ser bastante extensa. No conjunto,
uma total ausência de auto-importância, o que talvez seja o carro-chefe dos demais
atributos.
Outra característica do sábio é estar
em paz com suas posses materiais. Por sinal, a um sábio – Sócrates, de quem
Platão foi discípulo – é atribuída a frase: “Não ter necessidades é divino.
Assim, quanto menos necessidades temos, mais próximos estamos do divino”. O desapego
aí inerente foi uma das características básicas da filosofia de Sócrates.
Desapego e contentamento são requisitos
essenciais na jornada em direção à sabedoria, à simplicidade, e têm como matriz
outra virtude fundamental: o discernimento, a capacidade de separar o verdadeiro
do falso, o real do irreal. Quando atingimos esse patamar de consciência – além do intelecto – vemos que perdas e ganhos são transitórios. Vemos que as necessidades,
em sua maioria, são filhas da ambição, gerando dentro de nós insatisfação, ansiedade, sofrimento. Ainda Shaw ensina: “As nossas necessidades são
poucas, mas os nossos desejos são incontáveis”.
Na parte de sua filosofia chamada
teodicéia, Sócrates – referindo-se à existência de Deus – diz: “Se o homem é inteligente,
também inteligente deve ser a causa que o produziu”. Nessa
causa repousa toda a complexidade e toda a simplicidade deste mundo. Quanto a
nós, a posição entre esses extremos pode decorrer apenas de ponto de vista: ignorância
ou sabedoria.
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