quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

Faz sentido alguém matar pela verdade?


Walter S. Barbosa (*)
Revivendo uma perplexidade antiga, no dia 11 de março deste ano um religioso americano queimou o Alcorão em praça pública, gerando protestos e mortes no Paquistão, contra os próprios paquistaneses.

Tendo se tornado a primeira república islâmica do mundo em março de 1956, o Paquistão é 96% muçulmano. Tal população rivaliza-se, porém, entre sunitas e xiitas (minoritários) por discordância sobre quem são os legítimos sucessores de Maomé.

Vitimando tais rixas seus próprios crentes, o mundo se perguntou sem entender nada: qual a ligação com o ato impensado do religioso americano? Difícil encontrar em termos lógicos, até porque a relação entre a violência e a lógica está mais nos domínios da psiquiatria. À loucura de um lado respondeu-se com outra, não restando dúvidas quanto à motivação bem terrena para o sangue derramado em nome de Alá.

Enfocando um reduto mais a oeste, a Palestina, Voltaire Schilling escreve: “Se a região, sob o ponto de vista econômico, material, foi sempre modestíssima, não tendo minas de ouro ou de mármore, nem sequer poços de petróleo (...), o mesmo não se aplica ao que ela representou na imaginação religiosa e sobrenatural dos homens. Não há, nem nunca houve, em mais de cinco mil anos de história, um território tão disputado e tão conflagrado como a área da Palestina e do antigo Reino de Israel”.

A questão religiosa, que deveria unir as pessoas, sempre esteve entre as mais freqüentes para conflitos, sendo incontáveis as campanhas guerreiras sob a figura do Cristo, que só tem por bandeira o amor. Tal contradição é uma identidade comum nas relações do homem com a busca da verdade, a partir do fato de que ela se encontra nele próprio, o que a torna o tesouro mais bem escondido do mundo.

Se a verdade não estiver dentro do homem não está em lugar algum porque, seja no homem ou fora dele, nada surge do nada. De outra forma seria um milagre, e este só ocorre na limitação de nosso juízo, vendo causas extraordinárias naquilo que desconhecemos. O universo é regido por leis imutáveis, como ocorre no fenômeno da eletricidade. Nisso é que se baseia todo o trabalho da Ciência.

Só assimilamos de fora o que já tem raiz em nosso âmago, num processo de gradativa “expansão” da verdade – ou seja, da consciência – como acontece na brotação da uma semente. Tudo está dentro dela, e vai surgindo na medida em que fatores externos, como a luz do sol e a água, exercem os estímulos certos.

Diante disso, a existência de religiões em si é um grande paradoxo, envolvendo edificações suntuosas, rituais, sacerdotes e outros intermediários para aquilo que, a rigor, não necessita de intermediação alguma. Porém, como poderia o homem sem ajuda externa descobrir a verdade que é ele mesmo? Não pode, ao menos enquanto seu aprendizado é tão dependente dos 5 sentidos, daquilo que ouve, daquilo que vê.

É pelos relacionamentos que o homem se conhece, usando a mente que está voltada para fora, examinando o mundo. Por meio desse espelho, e aprendendo a voltar-se para dentro, cada um pode encontrar o Self ou Deus Interno, sob a armadura do ego. Essa condição parece estar na essência do universo, onde o Criador – manifestado em seus múltiplos pedaços, como ensina o épico hindu Bhagavad-Gita – descobre a si mesmo em cada criatura. Pelo ponto de vista da criatura, é o que chamamos de "iluminação".

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