Walter da Silva Barbosa[1]
Como é possível alguém gostar de
sofrer? Difícil acreditar. Entretanto, é nitidamente o que acontece quando nos
agarramos a sentimentos como vingança, provocação dos outros – muito comuns no
trânsito – discussões intermináveis e outras manifestações do ego contrárias à
serenidade (a alegria sem opostos).
A partir da realidade espiritual –
onde o amor e paz existem para sempre, e por isso são ansiados por nós – o
sentido da vida se baseia na busca da felicidade. O que entendemos a respeito,
contudo, inclui qualquer manifestação de prazer, como recompensa mais próxima ao
nosso alcance, puxando-nos para o agora, amenizando a insatisfação latente que
em sentido amplo gera o impulso evolutivo.
O pano de fundo desse quadro é a
dor psicológica – ou sofrimento (inicialmente dói só na alma) – em geral
inexplicável em relação ao que vivemos neste exato momento. Para essa
constatação, basta nos perguntarmos: onde está doendo agora? Quando não tem saída para a consciência, extinguindo-se, esse
sofrimento se acumula formando o que Eckhart Tolle[2]
denomina corpo de dor.
“A vida só acontece no agora”,
também diz Tolle, sendo a percepção desse fato um dos portais para a iluminação.
A razão é clara: a pessoa que vive no agora eliminou a necessidade de buscar ou
“chegar”. Já chegou, descobrindo que o tesouro buscado sempre esteve com ela. A
atração pelo futuro não mais pressiona sua vida. E o passado? Obviamente ela também
já se livrou desse peso, habilitando-se a penetrar no mistério da totalidade da
vida, que é também a totalidade da consciência.
Incluindo tendências cultivadas
em vidas anteriores, o passado impacta o presente não só pela memória dos
fatos, processada no corpo mental, mas principalmente pela memória energética. Reconhecida
no corpo físico pelas trilhas neuronais (reação do corpo aos pensamentos e
emoções), a memória energética tem vida própria – consciência – buscando
sobreviver como qualquer outra forma de vida.
A filosofia esotérica denomina
essa forma de vida como “pensamento-emoção”. Formando uma bolha energética do
lado de fora do corpo físico, ela se nutre especialmente das emoções e
pensamentos negativos, fazendo com que eles retornem sempre. Quando vamos esquecendo-os
a bolha descarrega sua energia em nós e o pensamento-emoção volta. Assim ela
vai “engordando” cada vez mais. O que é isso, senão um “corpo de dor”, dotado
de quase infinita capacidade de autorregeneração?
Somente uma força pode mudar esse
quadro: chama-se consciência. Isso não significa pensar sobre o problema, o que
apenas reativa a “história triste” por trás dele, chamando de volta a emoção indesejada.
A consciência importa em render-se ao sofrimento, observar seu efeito em nosso
corpo (pontos de tensão, energia aprisionada) sem reclamação, sem queixas. Isso
é aceitar a realidade – esgotando seus efeitos – coisa que em geral buscamos evitar,
dando-lhe mais força.
Segundo a filosofia do yoga, a
atração e a repulsão têm igual peso no sentido de provocar dor. Em razão disso
o ódio desenvolve ao longo dos anos um formidável poder destrutivo,
especialmente no caso das nações, onde o pensamento-emoção coletivo forma um imenso
corpo de dor. Dificilmente ele poderá desaparecer, pois as pessoas o estão
continuamente desfrutando e alimentando com suas rixas.
Quando não conseguimos eliminar o
corpo de dor, ele deixa de ser um monstrinho apenas emocional-mental, para
lançar raízes em nosso corpo físico. Torna-se gastrite, câncer e outros males, assim
como, nacionalmente, provoca as guerras, podendo nos levar prematuramente deste
mundo.
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