Walter da Silva Barbosa[1]
A natureza da matéria é atração e
repulsão. A estrutura atômica se mantém pelo equilíbrio dessas duas forças: o
positivo e o negativo. Também no espaço infinito, os satélites e planetas formam
sistemas sob o comando de uma estrela, graças à atração e repulsão. Na vida da
natureza esse jogo está presente, significando harmonia. Somente no reino
humano o equilíbrio se desfaz. Por quê? Graças ao livre arbítrio.
Ao mesmo tempo em que a liberdade
para agir eleva o homem na escala da natureza – desenvolvendo poderes divinos dentro
dele – pesa-lhe a condição de sofrer enquanto atuar menos racionalmente que
seus próprios irmãos menores, os animais.
O budismo fala no “caminho do
meio”, que é a opção do equilíbrio, a ser alcançado pelo exercício da moderação
em tudo que fazemos. Por essa razão, no texto conhecido como “Óctupla Senda”, o
Senhor Buda menciona uma das principais fontes de dualidade e sofrimento: o
desejo, que é movido por atração e repulsão.
Ao entrar em contato com algo que
nos desagrada, o que acontece? Buscamos imediatamente o lado contrário, à
semelhança do vai-vem do pêndulo de um relógio. Esse impulso se alimenta do desejo
(corpo emocional) e também da reatividade (corpo mental), funcionando como “almas
gêmeas” dentro de nossa própria alma. Tudo aquilo que repelimos é o oposto que
não queremos ver – mas que obviamente continua a existir – e segue nossos
passos. Algo temos que aprender ali.
Fruto da mente em estado de
excitação, apego e temor, a reatividade não deixa margem à reflexão. Nossa
incapacidade de ouvir começa por aí, especialmente se o argumento do outro
contraria a “verdade” que é simplesmente o nosso interesse. Enquanto fingimos prestar
atenção ao que o outro diz, estamos arquitetando a resposta. A grande
dificuldade experimentada nos relacionamentos – sob o nome de
“incompatibilidade de gênios” – tem nessa característica mental sua principal
origem.
Quanto ao desejo, sua direção
obviamente é o prazer. Nossos movimentos são baseados na expectativa do prazer,
seja ele emocional ou mental (o que acontece no corpo físico é somente um
reflexo). Por trás do prazer, no entanto, há o fatalismo da dor, assim como as
duas faces de uma moeda: uma não existe sem a outra.
Na questão dos vícios que
envolvem atos físicos (alcoolismo, tabagismo) o oposto do prazer é visível no corpo
que reage e adoece ao longo do tempo. O reverso do prazer está ali, mas não
conseguimos vê-lo. E se por acaso vemos – mantendo o vício – naturalmente achamos
que o sacrifício compensa, não percebendo a real extensão da dor pelo bloqueio na
consciência. Dentro do jogo de atração e repulsão, fechamos os olhos ao sofrimento
em gestação, escolhendo o prazer fatídico de agora.
Em outros tipos de vício, ligados
aos pensamentos e sentimentos, a dificuldade de enxergar o oposto é ainda maior.
Sendo ações repetitivas fora de nosso controle, os vícios geram automatismos energéticos
impostos à nossa maneira de sentir e de pensar, facilitando o retorno daqueles
pensamentos e sentimentos com mais força.
O vício, portanto, não é só uma
questão física. Pensamentos repetidos de inveja, maledicência, luxúria e
mentira são comportamentos viciosos, cujo prazer tem como oposto a angústia,
falta de autoconfiança, vazio interior e outros reflexos da ausência de amor e comprometimento
em nossa vida. Às vezes chamamos isso de “má sorte”, ignorando que a sorte -
seja ela qual for - é criação exclusiva de nossas próprias mãos. Esse é o
premio, mas também o preço do livre-arbítrio.
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